Atletismo brasileiro mostra evolução em Lima, mas termômetro será o Mundial de Doha
Blog|Alessandro Lucchetti
O atletismo brasileiro se recuperou nos Jogos Pan-Americanos após uma participação apagada na edição de Toronto-2015. Nas disputas que tiveram como polo o Estádio Atlético da Videna, em Lima, a delegação nacional obteve 6 ouros, 6 pratas e 4 bronzes, 16 no total. Quatro anos antes, foram 13 no total (2,5,6).
Curiosamente, os resultados melhoraram num ciclo olímpico em que o volume de recursos diminuiu. Não existe mais o Brasil Medalha, programa de investimento em atletas de alto rendimento apontados como aqueles que teriam chances de medalha nos Jogos disputados no Rio.
O encerramento das atividades da equipe B3 de atletismo, que utilizou por muitos anos o nome BM&F, sacudiu a modalidade. O problema foi atenuado com a contratação de boa parte dos atletas pelo Esporte Clube Pinheiros. A redução de Orcampi, de Campinas, foi outra paulada que contribuiu para delinear um quadro de achatamento de salários dos atletas e redução do nível de competitividade dos torneios mais importantes do país, como o Troféu Brasil.
Mas não houve apenas más notícias neste quadriênio. É bem verdade que o tão falado legado olímpico, algo que poderia transformar a vida do Rio e, em parte, do esporte brasileiro, não é o esperado – mas exagera quem diz que ele não existe. Fazia parte do projeto da Rio 2016 a construção da Rede Nacional de Atletismo, um conjunto de 47 pistas oficiais espalhadas pelo Brasil, a maior parte delas projetada para receber certificação da Iaaf (Associação Internacional das Federações de Atletismo). Vinte e oito delas foram inauguradas antes mesmo que a pira olímpica fosse acesa no Maracanã.
“Muitos desses jovens talentos, como o Paulo André (100m rasos e 4x100m) treinam nas novas pistas. Mas ainda faltam pistas no interior do Brasil, que é muito carente desses equipamentos. Espero que sejam construídas algumas nos Colégios Militares”, diz Warlindo Carneiro Silva Filho, presidente da Confederação Brasileira de Atletismo.
Outros fatores explicam a melhor performance do Brasil. O Canadá, por ter sediado os Jogos de 2015, em Toronto, foi representado há quatro anos por sua equipe A, contando com feras como Andre De Grasse, Melissa Bishop e Shawnacy Barber. Resultado: 11 medalhas de ouro, sete de prata e nove de bronze para o pessoal da folha de bordo vermelha, segunda colocação no quadro de medalhas do atletismo.
Quatro anos depois, a federação canadense priorizou a preparação para o Mundial de Doha, que será disputado entre o final deste mês e início de setembro. Mesmo contando com alguns talentos em Lima, como os decatletas Damian Warner (segundo no ranking mundial) e Pierce LePage (sexto), o desempenho dos atletas que usam uniforme alvirrubro decaiu sensivelmente na Videna: cinco medalhas de ouro, seis de prata e quatro de bronze, o que significa a quarta colocação no quadro da modalidade, atrás de EUA, Brasil e Jamaica.
“O Canadá enviou uma equipe boa para Lima, mas não aquela superforte, que representou o país em Toronto. Esse fator isoladamente não explica o progresso brasileiro. Nossos resultados de fato melhoraram, e poderiam ter sido ainda melhores. O Gabriel Oliveira (110m com barreiras) era medalha de ouro garantida, mas caiu. O Paulo André também vinha de lesão. Conseguiu ainda a prata, mas esperávamos o ouro. Eu não apostava que o americano (Mike Rodgers) fosse correr tão bem”, diz Warlindo.
Seja como for, Warlindo reconhece que o Mundial de Doha é que vai dar o melhor retrato da situação brasileira no atletismo. Afinal, o Brasil competirá contra a equipe A dos Estados Unidos, a A do Canadá e as melhores de cada um dos demais países. “Doha será nosso termômetro. Vamos ver se o atletismo brasileiro estará febril ou em boa condição”, brinca Warlindo.
A título de curiosidade, a campanha do atletismo nacional na edição de Lima foi a terceira melhor da história do Brasil no evento, superada apenas pela registrada em Guadalajara-2011 (10 ouros, 6 de prata e 7 de bronze) e Rio-2007 (10,6,7).
Antes do Mundial de Doha, os fãs de atletismo poderão acompanhar o Troféu Brasil, em Bragança Paulista, de 29 de agosto a 1º de setembro.
Três curiosidades do atletismo brasileiro em Pans:
Ao longo de 24 anos, só Adhemar Ferreira da Silva, do salto triplo, deu ouros ao Brasil no atletismo do Pan. Foi tricampeão (51,55 e 59).
Após três edições sem ouro (63, 67 e 71), o atletismo brasileiro só voltou ao primeiro degrau do pódio em 75, curiosamente, com outro saltador: João do Pulo (campeão no salto em distância e triplo). O saudoso João repetiu o feito em 79, sagrando-se bicampeão em ambas as provas.
Só em 1983 o Brasil foi conquistar medalhas de ouro em provas que não fossem as de salto. Agberto Guimarães (800m e 1500m), Esmeralda de Jesus (100m rasos) e Conceição Geremias (heptatlo) foram os autores das façanhas.